Os agentes do mercado estão se movimentando fortemente nos bastidores da política municipal para assegurar que as ações de legislação sobre as terras não saiam do seu alcance. Querem manter o controle do que julgam ser seu por “direito”.
Isso é o que percebemos a partir do nosso mandato na Câmara de Vitória. Nos últimos meses, a PMV tem enviado ao Legislativo Municipal projetos de Lei que propõem, de forma fragmentada, alterações na legislação das terras urbanizadas. Foi assim com o projeto que autoriza o município a se desfazer de imóveis sem necessidade de aprovação da Câmara. E, também, com outro projeto que, no melhor estilo “jabuti”, pedia autorização para construir uma escola, enquanto propunha o aumento do gabarito na região da avenida César Hilal, em Santa Lúcia e em Jardim Camburi.
Desnecessário lembrar que todos foram aprovados rapidamente por uma base sempre disposta a abandonar suas prerrogativas fiscalizatórias. É importante registrar que temos apresentado emendas e feitos inúmeras críticas a esses projetos, na tentativa de bloqueá-los.
É uma antecipação de movimentos em torno da tentativa de reformar já, nos próximos meses, antes do início do ano eleitoral, o Plano Diretor Urbano de Vitória (PDU). Tudo encaixado. Por essa lógica, o PDU é o único instrumento capaz de sanar questões de desenvolvimento da cidade. Ignoram as necessárias articulações políticas e sociais, para dentro e fora da cidade, que poderiam nos permitir construir um Plano de Desenvolvimento Econômico e Social de Vitória, digno desse nome.
É bom lembrar que o Estatuto da Cidade, criado em 2001, define que a revisão do PDU deve ser feita a cada dez anos, no máximo. Vitória dedicou-se ao tema há pouco tempo, com uma grande revisão aprovada no fim de 2018. Uma nova revisão, neste momento, anteciparia em cinco anos, portanto, a reanálise do Plano. Revê-lo, agora, não é exatamente ilegal, mas a pressa do gesto desperta preocupações em quem defende que o Estatuto da Cidade e sua principal contribuição a esse debate, a adoção do conceito de função social da propriedade, esteja no centro das discussões sobre políticas públicas envolvendo ocupação e uso do espaço urbano. E, sobretudo, que qualquer alteração nesse importante dispositivo legal, seja fruto de ampla participação social.
Sintonizados com a importância do tema realizamos recentemente uma Sessão Solene na Câmara de Vitória para tratar do tema. Sob o guarda-chuva das comemorações dos 22 anos do Estatuto da Cidade, reunimos academia, sociedade civil, instituições, movimentos sociais e ativistas e colocamos o tema na ordem do dia. Estiveram no debate as instituições de ensino superior Ufes, Multivix, FAESA e FDV, movimentos e organizações como a rede BrCidades, o Movimento Nacional de Luta por Moradia, a Campanha Despejo Zero, a Federação Nacional de Estudantes de Arquitetura e Urbanismo, Associação ONZE8 e o Movimento Nacional População de Rua. Além deles, juntaram-se nessa articulação o Instituto de Arquitetos do Brasil - IAB, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, e a Defensoria Pública Estadual por meio do seu Núcleo de Defesa Agrária e Moradia.
Consideramos esse movimento um passo a mais no fortalecimento do debate e da formação de propostas que ajudem na superação dos antigos problemas urbanísticos da nossa cidade. Enfrentar barreiras estruturais, promover o diálogo entre sociedade civil e poder público e fortalecer políticas que garantam o direito à cidade são passos cruciais para construir um espaço urbano mais justo e inclusivo para as próximas gerações. E a união que buscamos pode favorecer todos esses aspectos.
O novo Censo, recentemente divulgado, ressalta a importância de aspectos centrais da característica de ocupação urbana de Vitória onde existem, segundo o levantamento, quase 15 mil residências desocupadas, enquanto cerca de 6 mil famílias (segundo o Instituto Jones) seguem sem acesso à moradia digna. Essas informações são corroboradas por outros estudos, como por exemplo, o realizado por professores da Faesa (2021) e que contou, inclusive, com a parceria da Prefeitura de Vitória, responsável pelo fornecimento da base cartográfica indispensável à realização da pesquisa. Nele foram identificados 217 imóveis abandonados ou em subutilização apenas no Centro. Comparado com um outro levantamento de 2019, da Defensoria Pública em parceria com BrCidades e AMACentro, houve um acréscimo de 90 espaços no período.
A Prefeitura está de posse desse estudo desde a sua conclusão. Mas, a julgar pela falta de iniciativas visando diminuir a quase nula oferta de moradias na cidade, não parece ter levado o documento muito a sério.
Nosso mandato aguarda que sejam apreciados pela Câmara, dois projetos de Lei que protocolamos já há alguns meses: o primeiro deles dispõe sobre a cobrança de IPTU Progressivo sobre a propriedade predial e territorial urbana, quando for constatada ausência de aproveitamento de solo urbano; outro pretende legislar sobre a necessidade de mapeamento periódico das propriedades urbanas que não cumprirem sua função social, em especial as abandonadas, e os solos não edificados, subutilizados e não utilizados.
É em torno de iniciativas e ideias como essas e da necessária resistência aos avanços desregrados do capital especulativo imobiliário sobre o espaço urbano, que estamos organizando as lutas e os debates, numa ação atuante e vigilante capaz de fazer frente à fome insaciável do capital e de seus defensores.
Vereador André Moreira (PSOL)
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Data de Publicação: quarta-feira, 27 de setembro de 2023
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